Produtor de Orgânicos

O setor público como alternativa de mercado para o agricultor familiar

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Rio, 6 de dezembro de 2018.
Foto: Sylvia Wachsner

Desde 2009 a legislação brasileira impõe obrigatoriedade a prefeituras e estados de adquirirem da agricultura familiar 30% dos itens destinados à merenda escolar. A Lei 11.947 se mostrou um salto na qualidade de vida de agricultores e pecuaristas onde o setor público se esforçou para colocar a regra em prática, mas não deve ser vista como única oportunidade para entrar no mercado das licitações federais, estaduais e municipais, afinal, abastecer as escolas públicas é apenas uma pequena fatia do grande conglomerado de instituições estatais.

Apesar de as iniciativas ainda serem tímidas, muitas abrem espaço também para a organização de novas cooperativas. A exemplo da Coascre (Cooperativa Agrícola de São Carlos), que em maio deste ano finalizou o processo de criação com o apoio da prefeitura de São Carlos, por meio da Secretaria de Agricultura e Abastecimento. A cooperativa é composta por 40 produtores de verduras, frutas e legumes que, durante um ano, participaram de capacitações e consultorias a fim de formatar melhor o negócio. Deu tão certo que a Coascre já nasceu apta a participar de chamadas públicas e licitações com o intuito de fornecer alimentos para a merenda escolar, por exemplo, inclusive com preferência, segundo informações de Deonir Tofollo, secretário de Agricultura e Abastecimento da cidade.

A aproximação e a parceria das cooperativas agrícolas com os governos é uma alternativa muito interessante de escoamento da produção, especialmente se considerarmos associações menores que encontram dificuldades em comercializar seus produtos. De acordo com Damian Paulo Chiesa, cooperado da Coopeg Orgânicos e produtor de folhosas e cogumelos, a cooperativa faz a venda de parte da produção para prefeituras e escolas estaduais na região da Serra Gaúcha, mas não amplia essa estratégia por falta de condições logísticas. “Um centro de distribuição na grande Porto Alegre, por exemplo, seria muito bom. Além disso, itens como suco de uva não costumam ter valores competitivos para nós, reduzindo as possibilidades de entrarmos em mais licitações”, comenta.

Esta, aliás, é uma questão a ser trabalhada com bastante atenção pelos gestores do Brasil. A produção orgânica no país é relevante, estimada em R$ 3 bilhões, mas recebe pouca atenção nas áreas de pesquisa e transferência de tecnologias, de desenvolvimento de estudos mercadológicos e mesmo na área acadêmica, com formação focada no setor.

Para Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência de Orgânicos, da SNA (Sociedade Nacional de Agricultura), alguns desafios da cadeia produtiva travam o crescimento desse setor da agropecuária. “Os produtores aprendem muito na base da troca de informações, porém precisam de mais espaços e eventos para que isso aconteça. Infelizmente o Ministério da Agricultura [Pecuária e Abastecimento] não apresenta estatísticas que permitam conhecer, mesmo nas grandes culturas, quanto o Brasil produz. E sem esses dados, fica difícil mensurar o mercado. Também carecemos de informações de quais produtos podemos exportar e para quais destinos”, ressalta.

A coordenadora do CI Orgânicos ainda reforça que a ampliação das oportunidades comerciais seria muito importante, sobretudo em relação a agricultores familiares, pequenas produções, associações e cooperativas. “Com o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), as prefeituras pagam até 30% a mais pela compra de orgânicos, tornando este um nicho bem interessante para os produtores. Adicionalmente, os gestores públicos oferecem a alimentação saudável que almejam”, comenta Sylvia e complementa “em alguns estados existem movimentos para fomentar parcerias entre produtores e escolas privadas a fim de oferecer alimentos orgânicos. Em outros estuda-se fornecer orgânicos aos hospitais públicos. A importância dessa dinâmica é que o fortalecimento desses produtores permitiria a consolidação da economia de cidades menores do interior”.

Iniciativas governamentais

Em agosto deste ano, a prefeitura de Campo Grande, capital sul-mato-grossense, divulgou uma série de contratos com associações e cooperativas agrícolas, para a compra de hortifrutis que seriam destinados à alimentação escolar. Ao todo, foram oito acordos assinados, no valor de R$ 3,9 milhões. Os mais valorosos foram firmados com a Associação dos Produtores Rurais do Assentamento Fiorestan Fernandes (R$ 1 milhão) e com a Cooperativa Agrícola de Campo Grande (R$ 1,5 milhão).

Iniciativas como esta estão surgindo com cada vez mais força no País, não só por conta da legislação, mas porque incentiva o desenvolvimento econômico e social da população. Em 2015, o governo do Espírito Santo ampliou sua parceria com o campo. A compra da produção agrícola capixaba, na ocasião, englobou 16 cooperativas e seis associações, cerca de 2,5 mil agricultores, 34 variedades de produtos e recursos que alcançaram R$ 5,3 milhões. A ação beneficiou 361 escolas de 78 municípios do Estado. Em Santa Rita (PB), a Secretaria de Agricultura já preparou o calendário agrícola, que identifica o período de produção e a disponibilidade dos itens para fornecimento ao longo do ano. Dessa forma, garante a organização do cardápio escolar, incluindo alimentos que fazem parte dos hábitos alimentares locais e atende às necessidades nutricionais das crianças.

A prefeitura de Maceió (AL) trabalha com a contratação de cooperativas da agricultura familiar desde 2013. No período, dobrou o número de fornecedores e o investimento na merenda escolar. Um negócio, que, na opinião de Clécio dos Santos, presidente da cooperativa Pindorada, do município alagoano de Coruripe, traz segurança aos produtores, pois passam a cultivar com a certeza da comercialização de sua safra; beneficia a prefeitura, que deixa de comprar alimento de fora do estado; e gera economia para o próprio município.

Na cidade de São Paulo (SP), o projeto Liga os Pontos trouxe a oportunidade de cooperativas da agricultura orgânica participarem do Programa Alimentação Escolar. Em parceria com agricultores do distrito de Parelheiros (SP), quase 1,5 mil escolas – de 18 prefeituras regionais – receberão verduras orgânicas para incluir na merenda. O contrato tem duração de um ano (até fevereiro de 2019), prevê a aquisição de 56 toneladas de hortaliças e receberá o investimento de R$ 239 mil. Além disso, o programa inclui a implantação de hortas escolares, a fim de proporcionar aos alunos conhecimento sobre agricultura e estímulo aos hábitos saudáveis.

Como o sistema cooperativo pode colaborar para a entrada nesse mercado

De acordo Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência de Orgânicos, da SNA (Sociedade Nacional de Agricultura), existem algumas áreas nas quais o cooperativismo poderia colaborar fortalecendo parcerias e colaborações entre os participantes da cadeia:

  1. As agroindústrias se queixam que a quebra de fornecimento de certos ingredientes muitas vezes impede a produção de alguns alimentos. Nossa produção de laticínios orgânicos, sobretudo de leite, está começando. Falta milho orgânico, assim como rações para a alimentação animal, o que dificulta sermos um produtor de mediano porte de carne ou avicultura orgânica.
  2. Necessitamos de pesquisa para produzir sementes orgânicas de qualidade e incrementar os insumos disponíveis que alavanquem a produção. Não contamos com equipamentos apropriados para pequenos agricultores, que lançam mão de suas próprias adaptações. Soma-se às limitações descritas o problema da produção sazonal, que é concebida de forma mais rudimentar.
  3. A produção de orgânicos é variada e pequena. Os produtores necessitam agregar valor aos produtos e reduzir as perdas pré e pós-colheita. Devemos fortalecer os centros de distribuição e incrementar variedades e quantidades.
  4. Incrementar parcerias com entidades que possuam experiência no setor, como a SNA.

Fonte: MundoCoop

Clique na imagem abaixo e confira na íntegra o Guia do Produtor Orgânico da Sociedade Nacional de Agricultura:

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