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Sustentabilidade e comércio justo na região do Brejal, Rio de Janeiro

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Rio, 31 de janeiro de 2018.

Por Jéssica Silvano

Para conhecer uma das empresas mais importantes na produção de alimentos orgânicos do estado, localizada na região do Brejal, em Petrópolis (Rio de Janeiro), visitamos o Armazém Sustentável, inspirado na lembrança dos antigos armazéns. Fundada em abril de 2010, a empresa, que hoje é referência em produção orgânica, nasceu a partir do interesse de seus criadores, Luiz Henrique Fonseca e Gustavo Aronovick, pelas questões relacionadas à sustentabilidade e ao comércio justo. “O Armazém Sustentável foi o primeiro processador de alimentos do Brejal, o maior produtor orgânico do estado. Temos aqui a facilidade da logística na aquisição dos insumos produzidos pelos vizinhos e também da nossa própria logística, após a nossa decisão de plantar aquilo que consumimos”, afirma Luiz Henrique, um dos fundadores do Armazém.

Ele destaca ainda os motivos que os levaram a tomar a decisão de  realizar seus próprios cultivos. “Temos três vantagens em relação a isso: a econômica, já que o insumo acaba saindo mais barato; a questão da independência, já que alguns vizinhos que fornecem insumos para o Armazém não são tão constantes; e o chamado km zero, que consiste em não emitir ou emitir o mínimo possível de carbono. Hoje temos terras e funcionários para isso, colocando na ponta do lápis, percebi que valeria a pena plantar”, explica.

Geleias e produtos em conserva produzidos e vendidos no Armazém. (Foto: Sylvia Wachsner)

No Sítio que rodeia a agroindústria são plantados alguns dos ingredientes utilizados na fabricação dos seus famosos produtos, como as geleias de jabuticaba e de laranja-da-terra, além das conservas de berinjela e de pepino agridoce com gengibre. “O Brejal é o maior produtor de orgânicos do estado do Rio, mas, ainda assim, em alguns momentos ele não consegue atender a nossa demanda e precisamos trazer frutos de fora. Algumas vezes por causa da climatologia, mas outras porque o agricultor está focado em outro tipo de cultura, como folhosos e cenouras, produtos comercializados nas feiras de orgânicos e que garantem dinheiro imediato ao produtor”, explica Gustavo Aronovick, o outro sócio-fundador do Armazém. “Ficamos várias vezes sem ter acesso a esses insumos e resolvemos plantar parte deles, pelo menos na época do ano em que o clima nos permite”, completa.

A propriedade está localizada em uma área cercada por Mata Atlântica nativa e por diversas nascentes. Foto: Sylvia Wachsner

A propriedade, localizada em uma área cercada por Mata Atlântica nativa e por diversas nascentes, faz parte do PSA Hídrico – Pagamento por Serviços Ambientais, um programa da AGEVAP (Agência de Bacia), da Prefeitura de Petrópolis e, principalmente, do Comitê Piabanha. “Firmamos um contrato com essas três entidades, onde eles nos fazem um pagamento anual no valor de um salário mínimo”, afirma Luiz Henrique, destacando que o valor não é a parte fundamental, mas sim o fato de que enquanto eles forem donos dessas três propriedade, têm um compromisso com o projeto de manter os mananciais hídricos.

Os programas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) têm valorizado o papel do produtor rural na conservação dos ecossistemas, além de permitir melhorias na produção e no rendimento desses trabalhadores.

A propriedade faz parte do PSA Hídrico, programa da AGEVAP (Agência de Bacia), da Prefeitura de Petrópolis e do Comitê Piabanha. Foto: Sylvia Wachsner

O Comitê Piabanha, que tem como objetivo promover a gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos da Região Hidrográfica IV, situada na Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro, selecionou dez propriedades no Brejal, onde existe a bacia do Rio Bonito, um dos afluentes do Piabanha. A obrigação dos proprietários beneficiados pelo programa consiste na manutenção dos mananciais na área de Mata Atlântica. A Mata Atlântica intocada não pertence aos donos do sítio, mas, para proteger a área da ação de caçadores, os responsáveis pelo projeto cercaram a propriedade gratuitamente. “Isso evita que caçadores entrem naquela mata e cacem animais da fauna brasileira. Além disso, temos que manter toda essa mata que fica aqui na beira do rio (Rio Bonito), evitando assim o assoreamento e a diminuição da capacidade hídrica”, explica Luiz Henrique.

Em propriedades bem conservadas, o projeto fornece condições para o cercamento. Já nas áreas degradadas, seja pela ação do homem ou por queimadas, outros benefícios são concedidos, como por exemplo, o reflorestamento das áreas afetadas.

A produção orgânica e as ações de sustentabilidade ambiental

  • Água

Nas nascentes do sítio, a água brota naturalmente. Mas, na propriedade, também é feito um trabalho de captação da água da chuva a partir de calhas. “Em épocas de secas, captamos a água das caixas para termos um reservatório. Essa água é usada na agricultura e na limpeza do chão da fábrica. Já a água usada nos alimentos, vem de um poço semi-artesiano de água mineral, testada a cada 6 meses por exigência da vigilância sanitária”, explica Gustavo Aronovick.

  • Dejetos

Os dejetos passam por um filtro mineral, por um biodigestor e, por último, por um sumidouro. “Dessa forma, devolvemos água limpa para o rio”, explica Aronovick, nos mostrando o local onde é feito o tratamento de esgoto e as caixas de gordura provenientes da cozinha.

  • Compostagem

A composteira foi colocada no sítio, longe da agroindústria, na qual os dejetos orgânicos são devidamente separados.   O lixo reciclável e os resíduos da fábrica são colocados num compartimento específico.  Das cozinhas, tudo aquilo que é orgânico também é separado, sendo colocado nessas composteiras. Os proprietários nos mostram os três ingredientes misturados na compostagem: dejetos orgânicos, terra com húmus e folhas secas.

  • Lixo

O Armazém Sustentável separa o lixo, entregando-o a uma empresa que atua na compra desse material. “Mas não recebemos nada por isso, não temos interesse. O nosso objetivo é que esses materiais, como papel, metal, plástico e, principalmente, vidro, sejam separados e que tenham um destino correto”, afirma Luiz Henrique.

Mercado Orgânico

Produtos do Armazém Sustentável. Foto: Sylvia Wachsner

Os proprietários do Armazém reconhecem o momento de crise que o país vem enfrentando, mas enxergam que existe uma demanda pelos produtos orgânicos. “O Brasil passou por uma crise econômica muito grande, que afetou todas as atividades, entre elas a alimentícia, incluindo a orgânica. Acredito que exista uma demanda reprimida por esses produtos. Há sim uma certa dificuldade de conseguir insumos, mas por outro lado, nesse momento em que a crise econômica começa a diminuir um pouco, começamos a ver também o interesse de grandes empresas pelo produto orgânico”, afirma Gustavo Aronovick, citando casos recentes de aquisições de empresas orgânicas por grandes multinacionais. Aronovick destaca o exemplo da Mãe Terra, comprada recentemente pela Unilever, indicando que o mercado  começa a abrir os olhos para esse setor.

A aquisição da Mãe Terra, empresa brasileira de alimentos orgânicos, pela Unilever, multinacional britânica-neerlandesa, não teve seus valores divulgados, mas movimentou o mercado orgânico, dividindo as opiniões de especialistas e, principalmente dos consumidores.

Obstáculos

A logística é apontada por produtores e especialistas como o principal obstáculo ao crescimento do mercado orgânico no país. “Essa é uma questão séria aqui no Brasil. Em alguns casos, há uma incapacidade de você conseguir atender alguns mercados que solicitam produtos porque as transportadoras não atendem ou porque o frete se torna inviável. Então, você tem que fazer uma manobra para conseguir que seu produto chegue em um determinado lugar. E isso, muitas vezes, inviabiliza completamente a entrega”.

Os proprietários do Armazém nos explicam que, muitas vezes, o mais aconselhável é que a venda não seja feita porque ou a margem de lucro vai ser muito pequena ou porque será necessário cobrar um valor muito alto, fazendo com que o produto chegue na prateleira por um preço que ninguém vai querer pagar. “Chega uma hora que a pessoa tem noção dos valores. Ninguém vai pagar R$ 40,00 por um potinho de berinjela, por exemplo”, afirma Aronovick.

Fornecedores do Armazém

Os proprietários relatam que durante muito tempo tiveram dificuldade em manter os fornecedores, uma vez que havia uma preferência pela venda em feiras, onde era possível vender o quilo, direto aos consumidores, por um preço mais elevado. Com o passar do tempo os produtores entenderam que, se vendessem para o Armazém, poderiam ganhar em escala.  “Durante muito tempo, eles acreditavam que era melhor levarem seus produtos para as feiras onde é possível conseguir um preço mais caro pelo quilo no varejo. Mas, entenderam que vendendo para o Armazém ganhariam em escala, já que sim pagamos um preço um pouco menor, mas compramos uma quantidade maior”, explica Gustavo Aronovick.

A agroindústria

Preparação de geleias orgânicas. Foto: Sylvia Wachsner

Luiz Henrique nos explica o funcionamento da fábrica, instalada na propriedade, em um terreno de 20 mil m², com uma bela vista para as montanhas. “O alimento chega na área de desembarque dos caminhões ou vem da própria plantação. Esse alimento é primeiramente higienizado, com uma exceção, a jabuticaba, que assim como o morango, são frutos que precisam ser congelados conforme foram colhidos, porque azedam e se deterioram com a acidez”, explica. “Todos os produtos são higienizados em uma cuba, em banho de cloro, que é permitido pela norma orgânica porque seu uso é obrigatório segundo as normas da vigilância sanitária”, conta o proprietário, nos mostrando os locais onde todos esses processos acontecem. “A norma orgânica nunca pode contrariar a norma da vigilância sanitária. Se a vigilância sanitária exige que um determinado produto químico, como o cloro, seja usado, a norma orgânica tem que concordar com isso, feliz ou infelizmente”, explica.

Os alimentos são pesados, higienizados (ou não), e partem para um primeiro compartimento. “Dentro da fábrica, há um depósito de insumos, onde é preciso atender a duas normas que regem essa etapa do processamento,  a orgânica e, principalmente, a da vigilância sanitária. Toda área de produção é feita em superfícies lisas, sem arestas vivas, todos os cantos são arredondados e os materiais da parede e do teto são de acordo com as exigências da vigilância sanitária. Já a norma orgânica nos obriga a separar completamente todos os ingredientes convencionais dos ingredientes orgânicos”, explica, de maneira detalhada, o proprietário.

Assista aos vídeos da nossa visita ao Armazém Sustentável

  • Entrevista com os proprietários

  • Conheça o Armazém

A propriedade faz parte do roteiro de turismo Circuito Eco-Rural Caminhos do Brejal. Para fazer uma visita, com direito à degustação dos produtos, é necessário realizar um agendamento prévio. Para saber mais acesse www.armazemsustentavel.com.br ou entre em contato através dos telefones (024) 2259-2154 / 2259-2192 /9966-6437.

O Armazém Sustentável é parceiro da rede OrganicsNet. Para saber mais, acesse a página da empresa clicando aqui. 

Clique na imagem abaixo e confira na íntegra o Guia do Produtor Orgânico da Sociedade Nacional de Agricultura:

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